Conheça a saga do artista brasileiro Nestor Costa, o recifense por trás dos efeitos especiais de Star Wars.
Imaginar o mundo sem Star Wars é fácil, mas difícil mesmo é pressupor o que seria do cinema e da cultura pop se a saga mais amada do universo nunca tivesse sido feita. Talvez só tivéssemos filmes de ficção científica mais “cabecistas” ou, quem sabe, menos gente jovem interessada pela sétima arte. Mas, de fato, teríamos efeitos especiais bem menos evoluídos do que os que vemos hoje nas telonas. É que o cri cri George Lucas revolucionou a indústria com suas exigências técnicas complexas, a exemplo das maquetes, naves e criaturas que compõem a ambiência da trilogia original (1977 – 1983). Não é à toa que o estúdio de efeitos especiais criado pelo cineasta, o Industrial Light & Magic, se tornou um dos mais importantes da história cinematográfica.
É nesse contexto que se insere o artista brasileiro Nestor Costa, 36 anos, que trabalhou no estúdio como diretor de efeitos técnicos do Episódio VIII – Os Últimos Jedi. Nascido no Recife e criado em Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata Sul do Estado, Nestor realizou o sonho de muitos “jedaístas” quando foi morar em Vancouver – sede do Industrial Light & Magic no Canadá. Ele foi responsável, junto com outros técnicos, por processos simulados que incluem fogo, destruição, poeira, água, explosões, fumaça, magia, etc. Ou seja, a parte da computação gráfica que é muito complexa para um animador 3D fazer manualmente. Logo, se você assistiu ao trailer do filme, que é recheado de cenas de explosões e de bolas de fogo caindo do céu, já viu um pouco do trabalho do recifense, que também ajudou a desenvolver o visual das turbinas dos mega destroyers.
Agora, você provavelmente deve estar se perguntando como Nestor foi parar lá. “Desde que eu assisti Jurassic Park, em 1993, eu soube que queria trabalhar com cinema. Mas quando terminei a escola e fui procurar uma universidade que me levasse por esse caminho, vi que não havia nenhuma no Recife”, contou o técnico. Foi aí que ele colocou na cabeça a necessidade de tentar a vida no exterior. Mas não foi do dia para a noite que ele conseguiu trabalhar para um dos estúdios mais respeitados da Disney. Nestor juntou todas as economias dos seus trabalhos como artista gráfico e programador web e decidiu fazer um intercâmbio, em 2005, para estudar inglês nos Estados Unidos. Para isso, tirou um visto de estudo e trabalho que, na época, valia por três anos.
Na terra do Tio Sam, o recifense se instalou em Nova Jersey, onde trabalhou num parque de diversões por oito meses. Quando o parque fechou para a temporada de inverno, ele trabalhou em Vermont, numa estação de ski, e depois em Massachussets. Mas enquanto estudava inglês e trabalhava fora da sua área de interesse, Nestor procurava bolsa em alguma faculdade. Nisso, acabou conseguindo uma bolsa parcial para cursar animação na Digital Media Arts College, na Flórida. O que não deu muito certo. “Os cerca de US$ 9 mil que eu receberia da faculdade para ajudar a pagar o primeiro ano do curso viriam parcelados pelos três anos de duração dele. Então, já iria faltar dinheiro na entrada”. Foi aí que a Força despertou e agiu para recrutar o jovem padawan, que recebeu uma mensagem de um amigo nesse mesmo período falando sobre uma oportunidade no Canadá.
Enquanto aguardava o processo imigratório, Nestor voltou ao Recife, chegando a fazer o primeiro período do curso de cinema da faculdade Aeso, que estava em sua primeira turma, em 2009. “Não concluí porque vi que iria me formar numa cidade que não tem mercado. Quando tive uma resposta do processo, não pensei duas vezes e parti em março de 2010”. Dessa vez, Nestor levou a namorada, a arquiteta Bárbara Campelo, que atualmente é sua esposa. Lá, eles tiveram seus dois filhos, Noah, de quatro anos, e Adam, de um ano e meio.
A oportunidade era para fazer o curso de Artes Finas da L’Université du Quebec à Chicoutimi, que fica em Montreal, onde poderia estudar animação 3D e design digital por valores baixos. “Se você vinha de fora e era aceito pelo Quebec, eles pagavam boa parte da bolsa. Mas agora o processo de imigração está mais difícil porque passaram a exigir aprovação no francês”, explicou, comentando que foi aceito por conta dos trabalhos que fez no Brasil, como comerciais animados para o Boticário e para a TIM.
Nestor botou na cabeça que tinha que ser o melhor da turma para que fosse visto pelos estúdios. E parece que a estratégia deu certo. “Com o resultado dos meus projetos, uma empresa de Londres que veio para o Canadá me contratou antes de eu concluir o curso”, contou, falando sobre a Framestore. Lá, trabalhou nos efeitos especiais de filmes como As Aventuras de Paddington, O Destino de Júpiter, No Limite do Amanhã, Drácula: A História Nunca Contada e RoboCop. Quando foi ganhando reconhecimento, recebeu uma proposta da Cinesite, onde trabalhou em Assassin’s Creed e Independence Day: O Ressurgimento.
Foi de férias no Brasil que Nestor recebeu uma proposta que mudaria seus rumos para sempre. “A Disney me ligou e disse que tinha visto meus trabalhos. Não precisou nem comentar para qual filme eu trabalharia e eu já aceitei”, riu, comentando que pensou que fosse ingressar na Pixar, para animar Frozen 2. “Eu só soube que seria para Star Wars quando me mandaram o contrato”. Como a Industrial Light & Magic fica em Vancouver, Nestor precisou ficar longe da família por quatro meses, de abril a julho deste ano. “A área de cinema é bem puxada, mas também é muito prazerosa. Se você não é uma pessoa estressada, não tem estresse. E olha que eu cheguei a trabalhar 80 horas por semana”, declarou, enfatizando que é normal uma sequência de três segundos levar quatro meses para ser produzida.
A área para qual Nestor trabalha, na pós-produção, é uma das que mais paga bem na indústria cinematográfica. “Contando com as horas extras, dá para fazer uns US$ 300 mil por ano. Fora que trabalhar para a Disney é sinônimo de ganhar presentes o tempo todo”, comentou. Durante seu tempo no estúdio, Nestor não teve contato direto com Rian Johnson, o diretor do Episódio VIII. “A gente faz o nosso trabalho, o supervisor pega e passa a cena para o produtor do filme, que, por sua vez, mostra para Rian. Mas sempre recebemos um áudio dele com uma espécie de review”, explicou, antecipando que veremos muitas cenas legais de batalhas. “O público verá a ação que ficou faltando no Episódio VII. O que posso dizer agora é que muita coisa está prestes a ser esclarecida e que vale muito a pena assistir”.
Nos anos 1970, os filmes de Star Wars tinham efeitos visuais inovadores para a época. No último longa, O Despertar da Força, vimos uma tecnologia de captação de movimento no Líder Supremo Snoke. E a saga, sempre indicada ao Oscar por seus efeitos especiais extraordinários, deve continuar nos surpreendendo no próximo filme. É o que nos confirma Nestor. “Se um ator não faz um movimento legal, a gente vai e faz computação gráfica. Se for necessário, a gente altera até o reflexo dos personagens nas armaduras metálicas”. Para isso, o técnico faz uso de softwares como Houdini (Sidefx), Maya (Autodesk) e Nuke (Foundry), os quais aprendeu a manusear quando ingressou na Cinesite, em fevereiro de 2015.
Se é difícil para nós, fãs da saga, imaginar o que seria do cinema contemporâneo sem Star Wars, imagina para Nestor, que agora tem sua vida ligada para sempre à saga de George Lucas? O que muitos não sabem é que por um triz o universo dessa galáxia tão tão distante nunca teria existido, mesmo. É que Lucas sofreu um acidente em 1962, quando tinha apenas 18 anos e nem sonhava em seguir carreira como cineasta. Após uma colisão com outro veículo, um dia antes de sua formatura no colegial, o carro dele girou várias vezes na pista até se chocar contra uma árvore. Lançado pelo para-brisas, Lucas só sobreviveu por sorte. Ou pela Força, como preferimos acreditar.
fonte: jconline