Jota e Erre remetem muito mais às fotos de beldades (nuas ou vestidas) do que propriamente a Josep Ruaix, como consta na certidão do fotógrafo catalão, J.R. Duran.
“Nu artístico não existe. O que existe é foto boa ou ruim”, diz. Não acha que olhar diferenciado seja predicado dos fotógrafos. “Jornalista também é olho, escritor, policial, tudo depende do olhar, do feeling”, sentencia. Não acredita que haja uma valorização maior do corpo atualmente. “Hoje se pode falar menos besteira e em muitos países se mostra menos o corpo do que há alguns anos.” E também garante que – mais do que belos seios – o que conta mesmo numa mulher nua é a personalidade. “É o que mais marca e fica no olhar, independentemente do tamanho da bunda ou do peito.” Mas quem compra revista masculina talvez não esteja interessado em personalidade, não? “Certamente, mas eu vejo assim.”
O arquivo visual começa a ficar impresso na mente a partir dos 12 anos. Foi quando começou a ler muito – teve o privilégio de possuir em casa uma biblioteca com quase 2 mil títulos – e a ir ao cinema três, quatro vezes por semana. “Nessa época começa a coisa da observação e a ansiedade ou necessidade de ver a vida de perto.” Duran dá os últimos retoques nas lembranças e o passado aflora. “Me lembro de estar na escola com o livro de geografia aberto seguindo as cidades e lugares que eu queria conhecer.”
A fotografia o conduziu muito mais longe do que os sonhos infantis podiam dedilhar. Aos 60 anos, passaporte sem espaço para tanto carimbo, Duran também coleciona cidades. Só não esteve na Oceania. Desde 1991, registra em arquivo de Word todos os lugares por onde passou – não faz ideia de quantos foram. Dos mais óbvios e prováveis aos mais remotos, como o Rajastão e a Eritreia, na África, onde foi resgatar o personagem Corto Maltese, de Hugo Pratt, herói predileto nas noites da Catalunha.
Duran fez mais de cem capas da “Playboy”, com nomes como Xuxa, Luiza Brunet, Maitê Proença, Adriane Galisteu, Juliana Paes e Flávia Alessandra. Foram dele também capas recordes de vendas com musas instantâneas, como Tiazinha e Feiticeira (com mais de um milhão de exemplares). Também fez as mais recentes, nas quais corpo turbinado e fama são inversamente proporcionais.
Em seu livro “Cadernos de Viagem”, um diário sobre as viagens feitas entre 2008 e 2010, ele entrega um pouco mais. “Fotografar para a ‘Playboy’ nem sempre é a festa que todos pensam.” E, mais adiante, revela: “Nem sempre as pessoas que aparecem na revista têm um corpo tão perfeito quanto as páginas impressas fazem acreditar. Em várias ocasiões, eu não sabia nem por onde começar porque não tinha o que mostrar”.
Seja para fotografar corpos mais miúdos e seios naturais de anos atrás ou as versões mais esculpidas de hoje, Duran não apela para a sedução. “Eu não faço papel do fotógrafo sedutor, champanhe, isso não existe”, garante. “Não é um encontro, não é sedução, a palavra é cumplicidade.” Quando a pessoa chega lá, conta, já negociou com a revista, teve advogado envolvido – processo que, em alguns casos, dura meses. O que não impede que, na hora das fotos, umas fiquem mais inibidas do que outras. Mas sempre muito discreto, ele não menciona nomes. “Quem fotografa nu para revista masculina é por duas razões, vaidade ou dinheiro. Se é vaidade, não tem problema. Se for por dinheiro, tem que honrar com aquilo, é muito simples”.
Perguntado sobre os limites do Photoshop e da manipulação das imagens nos dias de hoje e se de fato ele o usa em seu trabalho, Duran afirma: “Eu contrato pessoas que usam. O Photoshop serve para criar fantasias, colocar um céu no lugar de outro, mas, quando se aplica nas pessoas e você enxerga que alguma coisa está errada, é porque está malfeito. E aí alguém se deu mal.” Leia dar-se mal como eufemismo na impossibilidade de publicar o palavrão dito.
Fonte: Valor