Formada na Escola de Belas Artes da UFMG, a mineira Natália Freitas foi uma das animadoras do longa indicado ao Oscar.
Natalia Freitas tinha 10 anos quando perdeu os pais. Para superar a dor, ela se refugiou na arte. Passava horas desenhando, assistindoa desenhos animados e jogando videogame, sem se dar conta do tempo. “Também gostava muito de ler livros de fantasia e quadrinhos. Eu entrava em outra realidade e ainda criava meu próprio universo mágico, fazendo revistinhas”, recorda.
A vida seguiu, o trauma ficou para trás. Mas anos depois, quando chegou a hora de escolher sua profissão, a mineira de Belo Horizonte não teve dúvida. “Queria trabalhar com animação. Era divertido e me distraia, e eu queria poder também distrair e entreter os outros”, explica.
Pouco mais de uma década depois, Freitas atingiu seu objetivo. Seu nome está nos créditos de “Moana: Um Mar de Aventuras”, mais recente produção da Disney, indicada ao Oscar de melhor animação, em que ela trabalhou no departamento de desenvolvimento visual.
“É muito bonito ver um filme de que eu participei sendo indicado para prêmios tão importantes como o Oscar. Mas mais importante que isso é ver a receptividade positiva do público. É um longa que irá acompanhar várias gerações”, celebra.
O caminho rumo a esse Olimpo animado começou, porém, no curso de Cinema de Animação e Artes Digitais da Escola de Belas Artes da UFMG, em que Freitas ingressou em 2005. Foi ali que ela descobriu a história do cinema com os professores Ana Lúcia Andrade e Heitor Capuzzo – e se apaixonou por animação tradicional nas aulas de Antonio Fialho.
Deste último, veio a inspiração para se aventurar fora do país. “Em 2008, ele mostrou para os alunos algumas cenas que havia feito para um filme na Dreamworks. Eu fiquei fascinada e, naquele momento, tive certeza: também queria fazer aquilo”, lembra. Fialho explicou para a aluna que havia estudado no Canadá, o que abriu muitas portas para ele no exterior. E a partir de então, Freitas saiu em busca de escolas e cursos de especialização no mundo todo.
A escolha acabou sendo pela Filmakademie Baden-Württemberg, na Alemanha, onde ela conseguiu uma bolsa e iniciou seus estudos em 2012. “Ali, tive a chance não somente de dirigir meu terceiro curta-metragem, mas também de trabalhar em vários projetos de alunos como artista 3D, muitos deles ganhadores de prêmios, como o Annie Awards, o VES Awards e o Anima Mundi”, revela.
O 3D, aliás, foi uma opção fundamental na trajetória da mineira. Freitas conta que, após se formar em 2009, foi trabalhar com animação 2D em Porto Alegre. Lá, ela atuou como freelancer em dez estúdios para se manter na cidade. “Nenhum deles me oferecia uma vaga. No entanto, eu via pessoas não tão talentosas sendo contratadas porque sabiam fazer algo com 3D ou no Photoshop. Aquilo me deixou furiosa, então decidi voltar para Belo Horizonte e estudar 3D com a ajuda de tutoriais na internet”, explica.
A decisão valeu a pena em 2015, quando ela viu uma vaga para sua área no Talent Development Program da Disney e se candidatou sem muita expectativa. Foi selecionada um mês depois. E, após três meses de treinamento, foi convidada para integrar a equipe de “Moana”.
No longa dos diretores Ron Clements, Don Hall, John Musker e Chris Williams, a mineira foi responsável, ao lado de 17 outros artistas, por dar cor às imagens. “Recebíamos do departamento de modelagem as fornas cinzas e, com orientação dos diretores de arte, aplicávamos as texturas e criávamos os materiais”, descreve.
Ela conta que fez muitas “cestas, tochas, bananas, tambores e cocos” para a produção. Mas o elemento de que mais se orgulha quando vê o filme são os tapas, um tipo de tecido feito pelos polinésios. “Eles podem ser vistos já na abertura, na cena em que a avó conta história para as crianças, na vila, nas casas e também na música do Maui, quando o fundo deixa de ser o cenário 3D na praia e vira uma espécie de ‘teatro de papel’”, destaca.
Freitas não foi a única brasileira que trabalhou em “Moana”, mas foi a única mulher do país na equipe. E ela ressalta que, mesmo que houvesse muitas outras mulheres na produção, a animação ainda é uma área que atrai mais homens – principalmente com o monopólio atual do 3D, que é mais técnico. “Mas este cenário está mudando. O número de mulheres interessadas em aprender 3D para trabalhar com cinema ou jogos está crescendo”, avalia. Ela, por sinal, é um ótimo exemplo disso.
Fonte: Jornal O Tempo