Ao terminar um dia de trabalho, Tchae Measroch está com suas mãos normalmente cortadas e machucadas. Ele trabalha, muitas vezes de joelhos, em uma pequena sala cheia de estranhos artigos: uma saia havaiana de palha, uma porta de carro, tacos de beisebol, espadas e facas de diversos comprimentos e uma rede de camuflagem geralmente usada para disfarçar equipamentos militares.
Tchae Measroch, de 36 anos, é um animado artista de efeitos sonoros que passa os dias descobrindo como fazer ruídos que ele nunca ouviu, como o de um mosquete do século 18 sendo carregado. Amostras de pisos de madeira o ajudam a criar os sons das pegadas de cada personagem, não importa em que local ou século eles apareçam. “Uma grande parte do trabalho são sons de passos”, explica.
As passadas pertencem a personagens como Jason Brody, o protagonista de Far Cry 3, um jogo de tiro campeão de vendas criado pela Ubisoft. A empresa é a quarta maior fabricante de games do mundo, segundo Michael Pachter, um analista do setor na Wedbush Securities. Mas o estúdio de produção de videogames da Ubisoft em Montreal, onde Measrock trabalha, é um dos maiores do mundo, com uma equipe de 2.500 funcionários. Ele emprega pessoas de 55 nacionalidades, e essa diversidade parece ajudar em seu estilo criativo particular.
É aqui que converge uma equipe predominantemente masculina de redatores, produtores, codificadores, diretores, animadores, artistas e outros para criar os mundos de fantasia de games como Assassin’s Creed e Far Cry. E, a engenhosidade de Measrock produz o casamento entre a ação na tela e os sons que a fazem parecer autêntica. Quando um pirata armado cai no convés de um navio no jogo, Measroch bate uma bolsa de couro com aros de metal contra uma tábua. Quando o vento sopra o capim alto, ele delicadamente agita uma saia havaiana diante do microfone.
A empresa talvez seja mais admirada pela atenção de seus jogos para os detalhes – a precisão histórica de uma luta de espadas na Itália renascentista, por exemplo, ou a sutileza emocional no riso de um vilão. Em 2012, a Ubisoft foi indicada como melhor editora de videogames por seis grupos do setor na E3, a conferência anual da indústria. “Eles definitivamente estão colocando a arte à frente das outras companhias”, diz Stephen Totilo, editor-chefe do site de videogames Kotaku.
A empresa se esforça para ganhar autenticidade, tanto que enviou um membro da equipe a uma escola de vela, por exemplo, para ele ajudar a criar uma cena de batalha naval em Assassin’s Creed. Mas, nunca colocam a arte à frente do dinheiro, mantendo os custos baixos e protegendo suas apostas. Nos primeiros nove meses de seu ano fiscal, que terminou em 31 de dezembro de 2012, as vendas totalizaram cerca de US$ 1,4 bilhão, 20% a mais que no período comparável um ano antes.
A companhia é especialmente conhecida por seu uso extenso de captura de apresentações, em que um diretor trabalha com atores contratados. Os gestos e expressões faciais dos atores, traduzidos em animação, tornam os personagens mais sólidos emocionalmente, como o vilão de Far Cry 3, interpretado por Michael Mando.
“Os olhos são o que você nota primeiro”, diz Jeffrey Yohalem, o redator-chefe do jogo, que criou o personagem. “Eles parecem olhar diretamente para você.” Para alcançar esses efeitos, os atores vestem capacetes de fibra de carbono com câmeras montadas a cerca de meio metro de seus rostos, que gravam qualquer expressão ou sorriso.
Um novo jogo geralmente começa com uma torrente de ideias entre um autor e vários produtores que dura cerca de três meses, diz Anne Gibeault, produtora associada de cinemática no estúdio em Montreal.
A Ubisoft emprega 7.450 funcionários em todo o mundo. Ela tem 26 escritórios em diversas cidades, como Xangai, Singapura, Casablanca e Bucareste. Todo lançamento da empresa começa com o aviso: “Este jogo foi desenvolvido por uma equipe multicultural, de várias religiões e crenças”.
Trabalhar globalmente também reduz os custos trabalhistas. Alguns empregadores dizem que a companhia é um ótimo lugar para começar (eles a chamam de “Ubiescola”), mas que, a menos que você seja um executivo sênior ou o produtor de um título de sucesso, os salários são mais baixos que os da concorrência.
A melhor maneira de se manter forte, sugere Yannis Mallat, executivo-chefe do estúdio da Ubisoft em Montreal, é continuar aumentando a excitação da experiência. “Hoje os jogadores são mais exigentes, com direito”.
Fonte: O Povo