Brian Krzanich, vice-presidente e chefe de operações da Intel, gosta de ilustrar a evolução do mercado de semicondutores ao compará-lo com o de automóveis. Em 1971, a Mercedes-Benz lançou uma geração de automóveis superpotentes, os modelos SL, capazes de fazer 235 quilômetros por hora e percorrer cinco quilômetros com um litro de gasolina. Se as gerações atuais desses veículos tivessem evoluído como um chip, um Mercedes, hoje, seria capaz de correr 940 mil quilômetros por hora e fazer 25 mil quilômetros com 1 litro de gasolina. E o preço deveria ser 50 mil vezes menor que na década de 1970.
Essa imagem ajuda a dimensionar o impacto da transformação pela qual a indústria de semicondutores vem passando desde os anos 70. A revolução mais recente foi feita a partir do transistor. O componente eletrônico tem as funções de transferir e interromper sinais elétricos que passam de um lado a outro de um circuito eletrônico. Na prática, é a base dos semicondutores.
Na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Universidade de São Paulo (USP), pesquisadores desenvolveram os primeiros transistores 3D nacionais. Em um transistor tradicional, o fluxo de sinais elétricos é feito no plano horizontal. Os pesquisadores mudaram o formato do transistor e, com isso, o fluxo de carga passou a ser feito em três “paredes” do transistor. Essa mudança permite aumentar em até três vezes a capacidade de processamento desses componentes, disse José Alexandre Diniz, diretor do Centro de Componentes Semicondutores da Unicamp.
“O primeiro transistor 3D foi produzido com 100 nanômetros, mas já está em desenvolvimento um projeto com dez nanômetros”, disse Diniz. Um nanômetro corresponde a um milionésimo de milímetro e é o espaço que ocupam 2,2 átomos de silício, componente base do transistor. No mercado global, os chips 3D mais inovadores possuem transistores de 22 nanômetros de comprimento. O transistor desenvolvido pela Unicamp é menor que o vírus da gripe, que possui 110 nanômetros.
De acordo com Diniz, pesquisas realizadas em todo o mundo indicaram que dez nanômetros seria o menor tamanho possível para um transistor. Isso porque 22 átomos alinhados de silício representam o mínimo necessário para permitir o fluxo de carga elétrica. A gigante de semicondutores Intel vende atualmente um chip com transistores de 22 nanômetros e desenvolve pesquisas para reduzir esse tamanho para 14 nanômetros.
Segundo Diniz, a produção feita na Unicamp não poderá ser aplicada pela indústria para a produção de bilhões de chips. A universidade usou uma técnica que faz o corte no silício com feixes de íons, uma técnica barata, mas de baixa produtividade. “O objetivo principal é conhecer os métodos de produção e desenvolver técnicas que poderão ser adotadas no futuro por empresas brasileiras que desenvolvem projetos de chip”, disse o especialista. A partir dessa pesquisa será possível desenvolver novos chips para smartphones, tablets e outros eletroeletrônicos.
A técnica que será usada para o transistor de 10 nanômetros é a mesma adotada pela USP e envolve o uso de feixes de elétrons para cortar os fios de silício.
Jacobus Swart, professor titular da Unicamp e coordenador de projetos do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Sistemas Micro e Nanoeletrônicos (Namitec), disse que outra vantagem do projeto é formar profissionais para desenvolver semicondutores no país. “Essa é uma das queixas de empresas de semicondutores que vendem chips no Brasil, mas não instalam fábricas [no país]”, afirmou.
Quase todos os chips usados no Brasil são importados. No ano passado, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, as importações de chips totalizaram US$ 4,8 bilhões, ante US$ 5,1 bilhões em 2011. No Brasil, há duas fabricantes de maior porte. Uma é a Ceitec, estatal vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que produz chips de 600 nanômetros. Outra é a SIX Semicondutores, fundada em 2012 pela Six Soluções Inteligentes (do grupo EBX) e pelo BNDES, e que prevê fabricar chips de 90 e 130 nanômetros a partir de 2015. “No mundo, menos de dez empresas fabricam chips da geração de transistores de 20 nanômetros”, disse Swart. Para ele, há espaço no país para o desenvolvimento de diferentes gerações de chip.
O estudo da Unicamp faz parte de um projeto liderado pelo Namitec, desenvolvido no país desde 2009 e que envolve 23 universidades e institutos de pesquisa. No país, existem 120 pesquisas em realização com transistores 3D. Esses estudos contam com R$ 11 milhões em recursos fornecidos pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e pelas Fundações de Amparo à Pesquisa dos Estados.
Fonte: Investe SP